sábado, 30 de maio de 2009

Jabuticabeira


A jabuticabeira da minha varanda dá flores brancas com perfurme de arco íris. Nos dias amargos ela- tenra árvore- me estende as mãos-folha cheia das doces frutas. As jabuticabas gordas e suculentas derretem-se em minha boca alegre. Nos meus dias de Sol lá está ela, a jabuticabeira formosa sambando ao vento comigo. Nos meu dias de Nuvem, a jabuticabeira sente o tempo estranho, assobia e como quem não quer nada me abraça amorosa com seus galhos de chuva.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Coração de criança



Eu tenho coração de criança que berra, chora, esperneia.
Mas ele faz isso escondido, pois é coração tímido.
Se esconde na barra da saia e faz bico feito tromba de trompete.
Ele, triste, não quer aparecer feito palhaço
e por isso se enterra
na areia movediça da praia.

Eu prefiro quando meu coração criança
volta a desenhar naquela areia molhada.
A criança com asas cria até doer o dedo
e nem se preocupa com sims e nãos.

Brincando de imaginação infinita

colore cada traço em branco,
cada franzir de testa,
qualquer e todo pesar.

Ilustração: Irisz Agocs (http://artistamuvek.blogspot.com)

O acorde certo



Nessa semana estive tão fraca. É como se não restasse energia nem para respirar.
Muitas vezes sinto - e quase vivo- a dor profunda do outro. Na tentativa de salvar aquela pessoa querida muitas vezes me afundo na onda agitada, engulo água, perco meu prumo e ainda caio de cara na areia. Na dualidade de ser ora muito forte, ora extremamente frágil vou tentando descobrir o acorde certo, a harmonia do possível.

Ilustração: Irisz Agocs (http://artistamuvek.blogspot.com)

sábado, 16 de maio de 2009

Entrelace

Eu saio na noite em busca... E a busca depende da noite, do humor, da cor da lua. Tem noites que busco aquela melodia acquosa, fluida. Noutras quero o dançar frenético, as músicas esfuziantes, a liberação dos prazeres.

Mas nesta noite, quero apenas o teu beijo vagaroso. Esse afago, carinho pluma que me arrepia o corpo. Seu toque suave e harmônico é ao mesmo tempo intenso, fogos de artifício. Me entrego nos artifícios dos teus entrelaces noturnos.

Árvore



Olho para essa árvore frondosa
que só a raiz dá duas de mim.


Árvore, como faço para ser como você?
Impávida, grandiosa,
sendo apenas você mesma
nas tempestades da vida
no sol, no vento, no tempo.


Como faço para ser tronco firme,
mas folha que chora como cachoeira
e galho que se flexibiliza
em um abraço?

Ensina-me a dança
das suas folhas
o encanto do existir.

foto: Christopher Isenberg

Palavras

Como é que pode? Palavras -`as vezes uma palavra - mudar toda uma vida? Porque foi isso que aconteceu nessa noite. Conversando com o meu pai , ele me disse as palavras exatas que mudaram todo um registro já antigo, empoeirado sobre o que eu achava que era. Era, continuava sendo e não podia mudar.

Reconheço que eu também estava de coração aberto para vibrar e botar para dentro as palavras ditas. Eu realmente ouvi e internalizei, palavras que talvez antes não daria importância, mas que hoje, sentindo-me frágil e apertada, foram essenciais para que todo um registro de vida fosse mudado.

Para mim essa noite seria mais um jantar de taças vinho escuro tintilantes e conversas aéreas logo esquecidas. Nem a chuva fina lá fora imaginaria que nesse encontro com as palavras aveludadas de meu pai, eu teria a chance de reconhecer em mim aquela nova essência, natureza oculta que agora - ainda surpresa - me deparo.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Vidro


O mesmo vidro que brilha e reluz
estrela pontiaguda
corta e sangra a pele.


Em que vidro vens tocando?
A maneira de tocá-lo é essencial:
Rispidamente ou com ternura?


Depende do humor,
da nau dos ventos pensantes,
do pesar chuvoso do coração.


Coração que`as vezes
é vidro fosco e opaco,

outras vidro límpido acesso.

Foto: Philipe Pithon

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Dançando a dois




Dançando a dois meus pensamentos param, entram em total silêncio e eu viro só sentir. Sinto o corpo e os passos do outro me guiando... Me perco nos passos ritmados do bailar. A música transborda pelo meu corpo. Vivo só a dança e tudo o que ela me traz: calor, movimento, contato com o outro, o rubor da pele, o respirar ofegante, o encontro dos corpos, rodopios, o roçar dos quadris, pernas, passos sincopados, descompassados, calafrios, o cheiro, o tato, o corpo virando líquido, a liberdade de voar.

Na plenitude da Dança não há questões ou que serás.

Feito estrela



Você leu essas minhas palavras tentando me decifrar.
Mas bastava perceber os meus olhos brihantes feito estrela,
piscando exagerados (como num desenho animado)
que perceberia o que palavra alguma poderia expressar.

Sonhos



Me perguntam: você ainda não desistiu?

Mas como é possível desistir dos sonhos, daquele balão amarelo-vermelho que infla e sobe comigo? A intensidade que sinto em cada uma dessas experiências - de amar, de doer, de ser- não me deixa parar. A fixidez é algo que há algum tempo desconheço. A faxina interna é densa e incansável. Nesse camaleonar de formas, pensamentos, esqueço quem fui.

Descubro a cada gota quem sou.
Descubro em cada toque essa nova mulher.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Sobre as Dores




Eu durmo encolhida como concha na esperança de que nos sonhos multicoloridos tudo sare. Mal acordo e lá vem aquele buraco doído que faz uma algazarra dentro de mim. Enfio a cabeça dentro dele e quase saio do outro lado (como é fundo!).

Na lama das emoções fico esperando os minutos passarem. Alguma dessas dores fraquejam, se cansam com o tempo e dizem: Adeus! Mas tem aquelas que, não importa a maré ou dia de sol, estão sempre lá. Essas me preocupam, pois vazam um rio. Arde. Cutuca. Incomoda. Dói.

Algumas dores tento curar com bálsamo de flor de lótus, corredeiras límpidas e tranças de menina. Cada uma dessas dores nasceu de um jeito e por isso são únicas. De umas viro amiga, confidente, até amante! Com outras ainda brigo, fecho os olhos, cruzo os braços, perco a paciência e tateio no escuro.

É o eterno vai e vem do sentir.

ilustração: Nicoletta Ceccoli

domingo, 10 de maio de 2009

Sobre as Partes

Ouvi dizer que aquelas partes minhas que eu não quero olhar são as que depois ficam enormes e me Devoram. Sim! Devoram com letra maiúscula. Por isso faço o seguinte acordo com elas: eu as olho só um pouquinho e até levo para passear! Em troca é só não me incomodar. Tem que virar coisa invisível, notícia desbotada, cacos caquéticos que não colem mais. Depois é só sumir no espaço como cometa. Não é simples?

Eis que pula uma dessas minhas partes- que insisto em não aceitar- no meu colo e me encara. Você não tem senso de humor! Jogo essa parte no chão e ela se quebra como um espelho...
E agora são milhares de partezinhas que eu não queria ser. Não tem jeito. Repiro-as para dentro antes que me possuam.

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Zum... Zum



O meu coração fica apertado como ponta de alfinete. Vejo a vida passando galhofeira, dando risada ao meu lado, me mostrando o caminho dos outros. O furacão interno, a espiral que gira gira, bailarina lunar, já não é suficiente para me levar adiante. Sinto-me batendo no vidro, melancólica e um zumbido... Zum, Zum...

Para onde vai esse rio? Eu mesma não sei. Quero que flua com direito a redemoinhos, ilhas flutuantes e peixinhos reluzentes`a luz do dia.
Água viva dançando transparente.

Que venha o inusitado.


ilustração: Nicoletta Ceccoli

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Gira gira

Ar delirante
Ar dançante

Gira gira comigo
Na dança das minhas partes tontas desatinadas
Partes que já não alcanço
E me põe louca ao seus pés

Sobre Roteiro



Eu gosto de escrever roteiro. Não me leve a mal. Mas eu estava restrita, amarrada, presa no tempo e no espaço do roteiro:

INT. CASA FECHADA DO ROTEIRO- NOITE

Hoje me permiti sair e olhar para fora. Mudar de ângulo, ver o que a miopia já não me deixava escrever. As palavras podem libertar, mas eu me aprisionava no formado marcado, na cadência rítmica de "achismos", regras e roteiro. Um roteiro que a vida era obrigada a ser.

Se eu for demais estraga? Se voar alto machuca? Se sentir demais dói!

Pois deixe doer então! Melhor do que seguir na apatia e correntes do que não quero mais. Pode vir! Como a chuva que umedece o peito e leva tudo aquilo que não sou mais.


O Nada



Só hoje eu aprendi a viver o Nada.
No Nada o Sol bate no meu rosto brincando,`as vezes dançando.
A Lua sorri para mim açucarada. Em uma espiral lunar, feixes meio aquáticos reluzem, tocam, beijam minha pele...

Suave vou sentindo apenas esse instante

Aldeia do Sol



Na Aldeia do Sol vive-se o Agora.
E no Agora, a gente canta para o Sol,
toca o coração do outro,
reverencia a Lua, entra dentro de nós- mesmos,
e descobre o útero da Terra.

No calor e fervura da Tenda do Suor nos libertamos dos medos mais profundos e escuros do nosso mistério.
Nas viagens ao centro do nosso íntimo ruímos... e renascemos.

Lá você pode ser o que você quiser ser, pode amar sem limites e se despir de tudo o que já não é. Na Aldeia do Sol todos viram sorrisos brancos, mais leves e livres que beija-flor.

O choro vira sorriso de dentro, a dor um abraço mel,
a solidão o mais etéreo e sublime amor.
Um amor divinal e sólido que beija,
dança de alegria, pega na mão e ainda faz cócegas.